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Inacreditável! Corumbaenses andam pelo leito do Rio Paraguai até o farol

Corumbaenses estão perplexos com a situação do Rio Paraguai. Cenário do cotidiano da maioria que passa pelo Porto Geral e frequenta a prainha aos finais de semana está transformado. A surpresa com o baixo nível d’água fez com que Elanir Miguéis, 45 anos, registrasse moradores andando pelo leito do rio até o farol de Corumbá, a 428 quilômetros de Campo Grande.

“Fiz essa foto no último domingo (22). Passo pelo Porto Geral todos os dias e fico triste de ver tão seco assim. Nunca tinha visto chegar nessa situação. Parece evaporar de um dia para o outro”, lamenta.

As imagens foram compartilhadas pelo tio, o militar da reserva, Gilmar Gonçalves de Souza, 65 anos. Ele mora em Corumbá há 42 anos e passa pelo local cerca de três vezes na semana. “Nunca vi assim. É a primeira seca grande que vejo. Muito triste a situação, em todo sentido. O Pantanal que eu conheci em 79 quando cheguei aqui, mudou nos últimos dez anos. Alguém tem que fazer alguma coisa. O próprio homem está destruindo a natureza, o próprio homem está desmatando e assoreando os rios”, lamenta.

Ele que navegou muito pelo curso d’água relembra que o farol de cerca de 4 m de altura era visto pela metade, da embarcação. “Hoje por exemplo não sei se consegue passar navegação. O farol ficava com uns 2 metros da ponta para fora d’água. Hoje está mostrando a sapata do farol”, acrescentou.

Sou militar e naveguei muito nesse rio. Alguns tipos de embarcação navegam, mas barco da marinha que vieram para cá precisam de 3m de profundidade para navegar. Nosso rio está dando uns 60 cm, no canal está dando 1m. Cheguei a entrar na água e ir até bem próximo do Farol. Nunca pensei que um dia ia conseguir fazer isso”.

Ele acrescenta que além da seca provocada pela estiagem nos últimos anos, a fumaça toma conta da cidade e o calor está além do normal. “Só tá fumaça. Ruim para respirar e o calor tá mais de 40º C”.

Vai piorar – Em Ladário, estação de referência com 124 anos de dados históricos, a cota atual é de -45 cm, apenas 20 cm acima da mínima histórica, que é de -61 cm, registrada em 1964.

O valor da cota abaixo de zero não significa a ausência de água no leito do rio. Esses níveis são definidos com base em medições históricas e considerações locais, sendo que, mesmo quando o rio registra valores negativos, em alguns casos ainda há uma profundidade significativa. No caso de Ladário, por exemplo, abaixo da cota zero, o Rio Paraguai ainda possui cerca de 5 metros de profundidade, conforme dados da Marinha.

Movimentação de moradores na prainha do Porto Geral, no último domingo (22) (Foto: Elanir Miguéis)
De acordo com o pesquisador da Embrapa Pantanal, Carlos Padovani, esta é a segunda maior estiagem do bioma. Os dados que registram a série histórica que integra 80% da Bacia do Alto Paraguai já registraram estiagem pior na década de 60 que durou cerca de 10 anos seguidos.

“Estamos com cinco anos agora. Essa estiagem já era prevista pela organização mundial de meteorologia, de 2019. Não sabemos quando vai terminar. Embora seja semelhante, o quadro é diferente por conta do uso da terra e das mudanças climáticas”, acrescenta.

Ele afirma que ainda não há como prever o grau de impacto desta estiagem na bacia. “Estamos sentindo principalmente a temperatura e falta de chuva, típico para estiagem, mas a temperatura está acima. Com a falta de chuva e as temperaturas muito altas, o sistema perde cada vez mais água”, destacou e acrescentou que o diagnóstico é muito difícil.

Apesar do Pantanal ter um regime de chuva bem demarcado, com avanços e atrasos, as chuvas são esperadas entre outubro e março. Mas neste ano as chuvas estarão abaixo da média e chegarão de forma atrasada.

O Rio Paraguai ainda está em fase de vazante, que pode se prolongar até outubro novembro. Ou seja, o aumento no nível da água vai demorar mais. Temos a chance real de chegar nessa marca histórica. A situação como um todo está bem crítica, precisaria de um volume de chuva bem grande para resolver. Também é preciso ressaltar que não importa quando chove, mas como chove. Essa chuva precisa ser bem distribuída”.

População mergulha até o meio do rio que está com – 45 cm nesta terça-feira (24) (Foto: Elanir Miguéis)
Carlos acrescenta que o termo ‘estiagem’ é usado para período de alguns anos onde há baixa precipitação e por consequência o nível do rio fica muito baixo. “Não sabemos quanto tempo ela vai durar. A última durou 11 anos. Há um grau de incerteza grande nessas previsões, por ocorrer uma somatória de situações simultâneas. O que temos de certo é o aumento da temperatura, e isso impacta em eventos extremos”, ressaltou.

Para a bióloga da Embrapa/MPF, especialista em ecologia de rios do Pantanal e de conservação e gestão de bacias hidrográficas, Débora Calheiros, a estiagem da década 60 e a atual é vista como um fenômeno natural.

“Mas agora temos mais desmatamentos, assoreamentos, impactos antrópicos em toda a Bacia. Pode estar ocorrendo um fenômeno natural acrescido da influência das mudanças climáticas. Isso faz com que as previsões sejam ainda mais difíceis. Tudo dependerá das chuvas, que devem começar até a 2ª quinzena de outubro”, reforçou.

O biólogo do IHP (Instituto Homem Pantaneiro), Sérgio Barreto, mostrou preocupação com o futuro. “A situação é bem crítica e a tendência é abaixar ainda mais. Isso é preocupante. As pessoas já chegam andando até o farol. Embarcação não passa mais entre o farol e a prainha do Porto Geral”. – CREDITO: CAMPO GRANDE NEWS

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